sábado, 9 de outubro de 2010

O QUE SE ESPERA...



Segundo Erich Neumann o desenvolvimento da consciência transita por cinco fases desde a vida intra-uterina até os 21 anos quando, então, considera-se que o ser humano entra no momento de compreensão de si e do coletivo, na maturidade.

Na primeira fase, que vai desde a vida intra-uterina até os seis meses, aproximadamente, o ser humano não tem consciência de si, vive de acordo com os desejos e necessidades maternas. A inconsciência é tamanha que a comunicação em ambos é feita como se mãe e filho fossem uma única pessoa. Essa fase é caracterizada pela “participation mystique” que significa que esse ser não consegue distinguir-se como sujeito e tampouco como objeto, uma vez que ele é o poder que à mãe foi dado.

Se pararmos para refletir um pouco sobre essa primeira fase e voltarmos lá na história da humanidade, notaremos que a criança, assim como o homem das cavernas, vive no paraíso, onde são atendidas todas as suas necessidades de sobrevivência, não por ela, mas sim pelo o outro sem que precise dispender qualquer energia para obter êxito. Muitos seres humanos, já na fase “adulta” ainda se sentem nesse paraíso achando que o mundo entenderá quais são seus desejos e os satisfará, assim como a mãe o faz quando lhe dá o alimento no momento em que ele tem fome.

É o início ao culto do feminino onde a mãe se torna a Grande Mãe e a ela tudo é feito. É ela que deve ser cultuada e venerada porque é a matriz geradora de vida. Já na fase adulta muitos seres humanos ainda se vêem idolatrando essa mãe como a fonte geradora e à ela devem obediência, além de se sentir importante para ela e somente para ela. A mãe, por outro lado, faz de seu filho aquele que a salvará dos infortúnios que a vida propõe como se esse ser tivesse a responsabilidade e obrigações para com sua vida.

Na segunda fase, que vai dos sete meses aos cinco anos, o ser humano ainda vive numa ligação estreita com a mãe. Ele vive o mágico, usa seu corpo como elemento sedutor, é prepotente e se sente como aquele que dá o poder para a mãe. Ele começa a se perceber como sujeito, porém ainda não tem conhecimento e entendimento do que pode ou não fazer por sua livre escolha. Trata-se do “puer”, ou seja a criança, o infantil.

O “puer” é aquele que tem como atitudes positivas a espontaneidade, a criatividade, o interesse ativo pelas coisas de modo geral, a curiosidade, a participação, etc. e como atitudes negativas o afeto vivido na fantasia, considera o outro como uma ameaça, a entrega ao outro é um sinal de perda da liberdade, a preguiça, atitudes inadequadas diante de uma situação, a repressão de sentimentos, inadaptação social, isolamento, narcisismo, atitudes desdenhosas em relação à vida, etc.

Na terceira fase, que vai dos seis aos doze anos, o ser humano começa a adquirir consciência. Nessa fase a criança começa a se afastar da mãe, acha que o outro lhe causa problemas, se vê considerando a mãe ora como boa e ora como terrível. É a fase onde as crianças começam a acreditar em bicho-papão, em fantasmas. Aqui começa a entrar em cena o espírito como elemento propulsor para alcançar objetivos.

Na antiguidade é o momento da aparição das bruxas, dos dragões, dos deuses gregos, divindades que refletem as características psíquicas.

Na quarta fase, que vai dos treze aos vinte anos, o ser humano obtém recursos para se emancipar afastando-se totalmente da mãe. É a fase onde o ser humano se envolve com crenças e preconceitos. É o início de um segundo nascimento onde ele faz a separação do que é confortável, aconchegante e a lei, a ordem, a disciplina.

Nessa fase é comum o êxtase, o temor e ao mesmo tempo, o divino e esplendoroso. Tem-se início a moral e o refinamento da alma através do medo, da autoridade.

Na quinta e última fase, que é a partir dos vinte e um anos, o ser humano compreende seu papel na sociedade sabendo o que tem que fazer. Começa, então a viver a maturidade com luz e conhecimento. É o momento da busca de um parceiro afetivo-sexual. É a fase da conquista e libertação do herói. Segundo Byington, “Trata-se de um ego capaz de desapegar-se do seu narcisismo, ’virar a outra face’ ou ’amar ao próximo como a si mesmo’ porque sabe a função do Outro no seu desenvolvimento, a tal ponto que pode realmente empatizar o Outro e imaginar trocar de posições com ele”. Fase da compaixão, de empatia, de amor ao próximo. É a fase em que o homem busca o amor pelo amor, a ética pela ética, a justiça pela justiça, de acordo com uma vontade interna por valores interiores que transcendem a uma censura imposta do exterior.

É nessa fase que os símbolos de totalidade estão presentes, como a Eternidade, o Infinito, o Cosmos e a Existência.

O que se espera é que o desenvolvimento da consciência siga estas cinco fases dentro de um período estabelecido que vai da vida intra-uterina até por volta dos vinte e um anos, tendo então a fase da maturidade e consciência de si e do todo.

O que acontece é bem diferente do que se espera, em muitos casos, ou podemos dizer muitos dos seres humanos somente se dão conta de que há necessidade de um desenvolvimento psíquico quando chegam à meia idade, uma vez que são pressionados pela insatisfação de desejos não atendidos. Desejos esses que se situam entre a satisfação de uma necessidade e a demanda de amor. Essa insatisfação leva, na maioria dos casos, o ser humano a buscar meios de auto-conhecimento para chegar à fase da plenitude e satisfação plena.

Elizabeth Sartori

Baseado nos textos de:
Erich Neumann em História da Origem da Consciência
Carl Gustav Jung em O Desenvolvimento da Personalidade
Paolo Francesco Pieri em Dicionário Junguiano