sábado, 12 de maio de 2012
FRACASSO
O poema abaixo é para aqueles que aprenderam que o sucesso está vinculado a um fracasso e que ao reconhecê-lo, aceitá-lo com parte da vida e refletir sobre ele dá ao indivíduo a chance de ampliar sua consciência.
Vimos por aí muitos que se tornaram famosos e sucumbiram ao sucesso chegando ao ponto de perder sua identidade em prol de uma personalidade desejada e exigida, sob diversas formas e pretextos de outros, seja da família ou do coletivo, chegando até a morte por não aguentar a demanda.
Será que o ego tão inflado com o sucesso pode aceitar que em algum ponto fracassou? Para que ocorra o reconhecimento é preciso coragem, humildade, vontade e antes de mais nada, um firme propósito.
FRACASSO
Tudo o que tomei como vitória é só fumaça.
Fracasso, linguagem do fundo, pista de outro espaço mais exigente, e difícil ler a tua letra nas entrelinhas.
Quando punhas tuas marcas na minha fronte, jamais pensei na mensagem que trazias, mais preciosa que todos os sucessos.
Teu flamejante rosto me perseguiu e eu não soube que era para me salvar.
Para meu próprio bem relegaste-me aos cantos, negaste-me fáceis êxitos, fechaste-me as saídas.
Era a mim que querias defender, não me outorgando brilho.
De puro amor por mim dirigiste o vazio que tantas noites me fez falar febril a uma ausente.
Para me proteger cedeste o passo a outros, tens feito com que uma mulher prefira alguém mais determinado,
afasta-me de tarefas suicidas.
Tu sempre vieste para me salvar.
Sim, teu corpo chagado, cuspido, odioso, recebeu-me em minha mais pura forma para me entregar à nitidez do deserto.
Por loucura eu te maldisse, te maltratei, blasfemei contra ti.
Tu não existes.
Foste inventado pela delirante soberba.
Quanto te devo!
Promoveste-me a uma nova classe, limpando-me com uma esponja áspera, lançando-me a meu verdadeiro campo de batalha, cedendo-me as armas que o sucesso abandona.
Conduziste-me pela mão para a única água que me reflete.
Por ti eu não conheço a angústia de representar um papel, de manter-me á força em um escalão, de subir com esforços próprios, disputar por hierarquias, inflamar-me até explodir.
E fizeste-me humilde, silencioso, rebelde.
Eu não te canto pelo que es, mas por aquilo que não me deixaste ser. Por não me dar outra vida. Por haver-me limitado.
Deste-me apenas nudez.
Certo que me ensinaste com dureza e tu mesmo me cauterizaste! Mas também me deste a alegria de não temer a ti.
Obrigado por tirar-me a densidade em troca de tuas rudes palavras.
Obrigado por me privar das vaidades.
Obrigado pela riqueza a que me forçaste.
Obrigado por construir com barro a minha morada.
Obrigado por apartar-me.
Obrigado.
Poema de Rafael Cadenas extraído do livro Ansiedade Cultural de Rafael López-Pedraza.
terça-feira, 8 de maio de 2012
EU E O CARTEIRO - VALORES, RESPEITO, ALTERIDADE...
Vinha eu pela marginal pensando e apreciando o fato de
dirigir e num determinado ponto houve um congestionamento. Percebi que não
chegaria ao meu destino no horário previsto, mas fazer o que? O jeito era
relaxar e esperar o trânsito fluir, mas mesmo assim eu não gostei muito de
andar em primeira e segunda. Bem, comecei então a refletir, cercada de várias
informações recebidas e vivências internas, sobre os filhos que somos.
Por definição a mulher contem no seu interior um masculino (Animus)
apreendido da relação com a figura paterna, assim com o homem contem no seu
interior um feminino (Anima) apreendido da relação com a figura materna.
Segundo Alberto Pereira Lima Filho no livro O pai e a
psique: O pai é mediador de uma relação; determinada em que bases, até que
ponto, dentro de que abrangência ou limites, com que regras, com que qualidade
de inserção ou afastamento, com que métodos, regularidades, finalidades,
responsabilidades e objetivos as diversas relações do filho com o mundo, com o
outro e consigo mesmo irão se estabelecer. O pai discrimina o mundo em
categorias, tornando-o compreensível e, portanto utilizável; interrompe o que
até então era natural” para instaurar o deliberado, o escolhido, o proposital,
o eleito, o consciente. E fornece critérios para tudo isso (...). Com seus limites humanizadores, o pai
apresenta ao filho os códigos da sociedade à qual deverá pertencer, mas a
confiança e o sentimento de segurança experimentados em relação ao grupo social
são heranças da relação erótica com a mãe, fundamento para todo relacionamento
ulterior.
Entendo que o que o autor coloca nesta frase seria o lado
positivo dos arquétipos, só que não é bem assim que acontece. Se mãe e pai
também enquanto filhos receberam informações sobre as quais representaram de
uma maneira negativa, passaram para os seus filhos a mesma informação, talvez, de
um modo diferente por que dependeram do momento cultural e social em que
estavam inseridos. Estes somos nós agora!
A função do pai é interditar a mãe, no que ela representa
para que o filho ou a filha se mova em direção ao mundo externo. Nesse momento
a consciência é afastada do inconsciente para promover o processo de capacitação,
instrumentação e diversificação de recursos. Fase que levará alguns anos até
que esses filhos, por conta de uma grande crise comecem a reconhecer que existe
um inconsciente que pede passagem. A famosa crise da meia idade!!!
Só que, na fase de seu reinado, de um modo geral, o pai se
porta como o deus-todo-poderoso não permitindo ao filho que ele o ultrapasse e
com isso o prende ao sistema patriarcal de valores proporcionando-lhe um
difícil acesso à alteridade que é a etapa de desenvolvimento psíquico posterior
ao patriarcado (matriarcado->patriarcado->alteridade->cósmico). Este
filho não percebe que é possuidor de uma energia para sentar junto ao pai e
apreciar, considerar, legislar, ir à luta e vencer. Já a filha se tornará refém
por sua servidão, uma vez que a mesma é desqualificada de valor enquanto ser
humano produtivo e contribuidor com a evolução e assim, estará tão envolvida no
patriarcado quanto o filho. Ela fará tudo o que puder para ser uma boa filha
para o pai, uma boa esposa para o marido, uma boa empregada para o patrão, uma
boa devota para o padre, ... A maneira como ela se sente capacitada para isso é
servindo e colocando o homem como detentor do poder, não se dando conta de que
ela é a genitora da raça humana e orientadora do que é natural, como nutrição,
cuidados, proteção...
Quando equilibrada a conduta mãe-pai, cada um dentro de suas
funções psíquicas procederá à alteridade que é um incluir o Outro na relação
ou, como disse meu analista Marcos de Santis, a alteridade é “Eu sou o Outro”.
Essa expressão “Eu sou o Outro” entrou pelos meus ouvidos e
se instalou em minha alma como se dissesse o quão feliz eu posso ser ao me ver,
ao me falar, ao me sentir, através do Outro.
É claro que depois de tocada na alma, a vida põe diante de
nós algo para que possamos sentir de perto e reconhecer o que apreendemos.
Ao chegar bem próxima ao meu destino vi o carteiro do bairro
se dirigindo para atravessar a rua por onde eu ia passar. Compreendi naquele momento o quanto valia a
sua atividade profissional e, sem ser tão necessário, pois na rua só havia um único
carro em movimento, o meu, parei para lhe dar passagem, ao que com um sorriso
largo ele me disse para prosseguir. Naquele momento senti o respeito mútuo
entre eu e o carteiro. Alteridade?!?
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