Vinha eu pela marginal pensando e apreciando o fato de
dirigir e num determinado ponto houve um congestionamento. Percebi que não
chegaria ao meu destino no horário previsto, mas fazer o que? O jeito era
relaxar e esperar o trânsito fluir, mas mesmo assim eu não gostei muito de
andar em primeira e segunda. Bem, comecei então a refletir, cercada de várias
informações recebidas e vivências internas, sobre os filhos que somos.
Por definição a mulher contem no seu interior um masculino (Animus)
apreendido da relação com a figura paterna, assim com o homem contem no seu
interior um feminino (Anima) apreendido da relação com a figura materna.
Segundo Alberto Pereira Lima Filho no livro O pai e a
psique: O pai é mediador de uma relação; determinada em que bases, até que
ponto, dentro de que abrangência ou limites, com que regras, com que qualidade
de inserção ou afastamento, com que métodos, regularidades, finalidades,
responsabilidades e objetivos as diversas relações do filho com o mundo, com o
outro e consigo mesmo irão se estabelecer. O pai discrimina o mundo em
categorias, tornando-o compreensível e, portanto utilizável; interrompe o que
até então era natural” para instaurar o deliberado, o escolhido, o proposital,
o eleito, o consciente. E fornece critérios para tudo isso (...). Com seus limites humanizadores, o pai
apresenta ao filho os códigos da sociedade à qual deverá pertencer, mas a
confiança e o sentimento de segurança experimentados em relação ao grupo social
são heranças da relação erótica com a mãe, fundamento para todo relacionamento
ulterior.
Entendo que o que o autor coloca nesta frase seria o lado
positivo dos arquétipos, só que não é bem assim que acontece. Se mãe e pai
também enquanto filhos receberam informações sobre as quais representaram de
uma maneira negativa, passaram para os seus filhos a mesma informação, talvez, de
um modo diferente por que dependeram do momento cultural e social em que
estavam inseridos. Estes somos nós agora!
A função do pai é interditar a mãe, no que ela representa
para que o filho ou a filha se mova em direção ao mundo externo. Nesse momento
a consciência é afastada do inconsciente para promover o processo de capacitação,
instrumentação e diversificação de recursos. Fase que levará alguns anos até
que esses filhos, por conta de uma grande crise comecem a reconhecer que existe
um inconsciente que pede passagem. A famosa crise da meia idade!!!
Só que, na fase de seu reinado, de um modo geral, o pai se
porta como o deus-todo-poderoso não permitindo ao filho que ele o ultrapasse e
com isso o prende ao sistema patriarcal de valores proporcionando-lhe um
difícil acesso à alteridade que é a etapa de desenvolvimento psíquico posterior
ao patriarcado (matriarcado->patriarcado->alteridade->cósmico). Este
filho não percebe que é possuidor de uma energia para sentar junto ao pai e
apreciar, considerar, legislar, ir à luta e vencer. Já a filha se tornará refém
por sua servidão, uma vez que a mesma é desqualificada de valor enquanto ser
humano produtivo e contribuidor com a evolução e assim, estará tão envolvida no
patriarcado quanto o filho. Ela fará tudo o que puder para ser uma boa filha
para o pai, uma boa esposa para o marido, uma boa empregada para o patrão, uma
boa devota para o padre, ... A maneira como ela se sente capacitada para isso é
servindo e colocando o homem como detentor do poder, não se dando conta de que
ela é a genitora da raça humana e orientadora do que é natural, como nutrição,
cuidados, proteção...
Quando equilibrada a conduta mãe-pai, cada um dentro de suas
funções psíquicas procederá à alteridade que é um incluir o Outro na relação
ou, como disse meu analista Marcos de Santis, a alteridade é “Eu sou o Outro”.
Essa expressão “Eu sou o Outro” entrou pelos meus ouvidos e
se instalou em minha alma como se dissesse o quão feliz eu posso ser ao me ver,
ao me falar, ao me sentir, através do Outro.
É claro que depois de tocada na alma, a vida põe diante de
nós algo para que possamos sentir de perto e reconhecer o que apreendemos.
Ao chegar bem próxima ao meu destino vi o carteiro do bairro
se dirigindo para atravessar a rua por onde eu ia passar. Compreendi naquele momento o quanto valia a
sua atividade profissional e, sem ser tão necessário, pois na rua só havia um único
carro em movimento, o meu, parei para lhe dar passagem, ao que com um sorriso
largo ele me disse para prosseguir. Naquele momento senti o respeito mútuo
entre eu e o carteiro. Alteridade?!?
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