Lacan chama o sentido da vida de Lei,
metáfora paterna, Nome do Pai (que dá consistência). Ele faz uso do Banquete de Platão
para entender a relação Sócrates (analista) e Alcebíades (analisando) ou se preferir, amado e amante.
“O
sujeito do desejo se apresenta quando o sujeito do significante passa a se
relacionar com uma falta de saber. Em outras palavras, com um pequeno furo na
sua regularidade. Já em relação ao sujeito do gozo a relação é com uma
significação a mais. O sujeito
do desejo se encontra na relação com uma falta de sentido, enquanto o sujeito
do gozo se encontra na relação com o sentido, que não deixa nada de fora, com o
um a mais.” Lacan
Real contem tudo que
é verbalizado e não é visto por ninguém porque não existe uma posição para
discursar sobre o verbalizado, pois passamos por perto e não nos
sensibilizamos. O real é um sistema de percepção da realidade no qual se tem a
necessidade de discursar. Exemplo disso é a vida do animal, ele vive no real,
no vazio, levando muito tempo para se transformar porque está disposto a uma
lei parametrizada pelas regras de cada espécie e o instinto determina as ações.
Nota-se que um animal não ataca se não se sentir ameaçado, pois, existe uma lei
do ecossistema que regula esse instinto.
A cadeia de
significantes (atos falhos, cistes, apelos, sonhos) de um dia, por exemplo, é ditada
imagem por imagem, segundo por segundo. Para se conhecer um indivíduo podemos
fazê-lo por amostragem, ou seja, um período da vida dele, como acontecimentos
do dia anterior, suas motivações e, assim, teremos uma leitura, como quando um
médico pergunta ao paciente quais a dores, o incômodo, desde quando. Ele faz
uma investigação de imagem a imagem para estabelecer um diagnóstico e isso produz
uma capacidade discursiva do paciente que dará o perfil da dor.
Um indivíduo
pode, em uma conversa, perder o contato de atenção com a exposição, no entanto,
ele não sabe dizer no que estava pensando. Pode ser que no momento em que o
interlocutor apresentava um exemplo de cachorro que late, pula, é agressivo,
etc.... qualquer dessas palavras o tenha levado a um desconforto e por isso se
abstraiu da explicação porque uma das palavras encontrou um buraco na estrutura
psíquica, onde não tem um discurso que daria um significado.
Quando há capacidade
discursiva mais ampla o indivíduo tem mais recursos para achar soluções, porque
irá significar as imagens com os recursos que tem. Se houver um excedente
agressivo, então a resposta será agressividade, porém se pegar a sequência
subjetiva do outro, não será necessariamente a sua sequência, a resposta terá
falta de objetividade, mas possibilitará uma “super-visão”.
Ex.: Nas guerras
de Roma, um dia um general subiu à uma colina e viu seu exército lutando de
todas as maneiras possíveis e inimagináveis, sem nenhuma estratégia. Naquele
momento ele percebeu que deveria montar estratégias e assim o fez. O exército
romano que já era invencível, ficou imbatível por mais 1.500 anos conquistando
vários povos. Hoje é comum um líder “subir na colina” para ter uma
“super-visão”.
O desejo de “ser”
não é um desejo de “ser em si” porque existe uma ordem de desenvolvimento na
psique que se molda na linguagem e as lacunas, os lapsos de linguagem são
aqueles que dão um limite na compreensão do indivíduo. Essa falha na linguagem
interfere na compreensão de algo lá na frente.
Ex.: Um homem que esteve com 10 mulheres cita
outro que esteve com 40, achando, então, que teve poucas mulheres. Ele tem
buracos na compreensão, desde fritar um ovo até comprar algo e essas mulheres
que faltam substituem a linguagem da angústia, mostrando que há um excedente
libidinal que produz uma resposta fora de controle, porém há a necessidade de
ser traduzido para produzir cultura. Em não ter um discurso, a ação provém do
instinto e ele precisa ser esgotado com um discurso sistemático. O psicopata é
aquele que não tem discurso, é aquele que não manifesta seus sentimentos, ele
não tem discurso. Podemos entender que
todo excesso é falta de discurso onde há um excedente libidinal que produz uma
resposta instintiva fora de controle (agressividade, sexualidade, poder.)
.___.___.___.___. = cadeia de significantes que compõe a lei
.___.___. x
.___. = cadeia de significantes com instinto que precisa do embate, onde
“x” é o instinto, a lacuna. O indivíduo que vejo irá receber as expectativas da
lacuna que tenho. É preciso decifrar o instinto.
Lacan afirma que não se pode definir o
significante sem o gozo(intensidade de energia cujo limite ainda não
se instaurou) , e que não se
pode definir o gozo sem o significante (atos falhos,
cistes, apelos, sonhos) . Portanto, traz uma nova definição de significante que se refere
ao corpo. Essa referência se faz sob a modalidade do sintoma. O sintoma inclui
o desejo e o gozo. Trata-se de restabelecer, a partir do Seminário 20,
uma noção que não separe o sujeito da substância gozante. Há um real (tudo
aquilo que não tem a obrigação de ser nomeado) no sintoma que deve ser incluído no seu conceito. A noção de
sujeito do desejo não comportaria o gozo irredutível a essa noção de sujeito do
significante.
Para a mãe que
tem buracos na sua estrutura psíquica, fruto de uma educação com lacuna, o filho
recebe as expectativas desse buraco. Ex.: A mãe não estudou. O filho precisa
estudar. Ela quer algo dele que cabe dentro de sua significação e o filho não
tem espaço para ir além disto. Ele é o sujeito barrado de si mesmo porque está
impedido de saber quem ele é, porque é o discurso da lacuna dos pais, com a
sensação de abandono, de estar sozinho, e em não se sentindo o sujeito que
determina as ações, é o objeto cuja ação já está determinada.
Tânia Cristina B. Cabral em seu Livro “Os
quatro discursos de Lacan e o teorema fundamental do cálculo” discorre sobre as
formulas matemáticas utilizadas por Lacan para identificar a estruturação da
linguagem, como segue:
“O sujeito do desejo é aquele que questiona os
efeitos do significante, localiza-se como sujeito barrado de gozo, e sujeito
diante da impossibilidade de uma última significação. Nesse ponto do ensino de
Lacan, o sujeito do desejo se encontra numa posição radical ao nível da
privação do objeto, já que há uma confluência entre o objeto a e o falo. Por conseguinte, o
sujeito é um objeto negativo (-φ),
é falta-a-ser.” Lacan
Segundo Lacan,
quando fala, o sujeito se submete a um processo complexo em que se imbricam
simultaneamente o imaginário, o simbólico e o real.
O conceito de
discurso em Lacan é precisamente este: Estatuto de enunciados. Não se deve
entender discurso como uma fala encadeada do professor que o aluno escuta,
invertendo-se ocasionalmente esses papéis, quando é o aluno quem fala.
“O
aluno abre mão da aprendizagem para manter o jogo da escola. Aprender seria
passar a ser outro, isto é, passar a outro saber que não o saber passar. Ele
recusa enfrentar-se com essa morte. O saber produzido no caderno é seu gozo
perdido: produziu, mas não gozou, só repetiu, não aprendeu, fez de conta.”
[CABRAL, 1992].
S₁ é o significante mestre. (agente)
S₂ é o saber, campo da lei,
o campo do grande Outro, lugar onde se pode falar em (des)obediência.
(trabalho)
Ṩ é o sujeito barrado, sujeito castrado. (verdade)
a
é o gozo, objeto perdido,
causa do desejo que se esconde na falha do Outro. (produção)
___ indica um recalque ou uma
omissão
→ O
impossível. É impossível que haja um
mestre que faça seu mundo funcionar e fazer com que as pessoas trabalhem é
ainda mais cansativo. O mestre nunca faz isso, diz Lacan. O desejo é sempre o
desejo do Outro.
▲ É a barreira que
separa os signos que figuram nos denominadores. O mestre só pode se sentir o
tal à medida em que se isola do a do
aluno e aparece como assumindo a função de mestre por mérito de conhecimento,
não por astúcia. Diz Lacan: Instalar-se tranquilamente como sujeito do senhor,
isso não pode ser feito na qualidade de mais-gozar.
S1 → S2
Ṩ ▲ a
Mantendo
as posições de agente, verdade, trabalho e produção veremos que após ter
atendido o desejo do Outro, o indivíduo não é mais o discurso do mestre. Os
significantes giraram, como o diagrama:
S₂ → a
S₁ ▲ Ṩ
Se
a função da demanda é exercida pelo próprio a, enquanto objeto
perdido, isso só é possível se um semblante do a passar ao primeiro plano e funcionar como tampão da falha do
Outro.
“Aí está o oco,
a hiância que, de saída, um certo número
de objetos vêm preencher, objetos que são, de algum modo,
pré-adaptados, feitos para servir de
tampão.” [LACAN, p. 48]
O
desejo que move o S₂
em sua função de saber é, então, causado por esse objeto, e constrói sua
fantasia
a partir do semblante que o objeto apresenta.
“ O objeto a é o que são todos vocês, na medida em
que estão aqui enfileirados.” [LACAN, p.170]
Discurso do analista ... discurso do
objeto
Desejo Outro Discurso do analista agente
trabalho
a → Ṩ Analisar é impossível a → Ṩ
S₂ ▲ S₁
S₂ ▲ S₁
Verdade perda verdade produção
Esse
discurso marca o momento em que o mestre passa a fazer aplicações da teoria
dada e passa alguns exercícios para serem resolvidos ou o momento
da prova. Na posição do agente temos o objeto a, que subitamente muda de semblante:
não é mais o estudante que comparece aí, mas o que se pode chamar objeto do conhecimento, em geral sob
a forma de um exercício a resolver. A verdade desse momento é o saber
organizado que, agora, não deve aparecer como tal, mas, sim, sob a forma
de uma intimidade do indivíduo com o objeto de conhecimento. É preciso que o
exercício não seja mera aplicação de fórmula, para que não se recaia no
discurso do mestre. É preciso que o indivíduo busque os elementos necessários à
solução na história de seu saber, na teoria, S₂, que agora comparece como fundação
recalcada. Quem trabalha para isso é o Ṩ, o sujeito castrado, este que se
contentava com sua posição de estudante da teoria e a quem se pergunta, quando
tira zero na prova: Afinal, o que você quer?
Poder-se-ia completar, para deixá-lo espantado: Não vê que agora é seu o desejo que move o processo?
[CABRAL, 1992].
Sua
produção deve ser agora a solução.
No momento em que o aluno entrega a prova, algo é dado por pronto: É isso aí. É o que pude fazer. Sou o
que sou. Produziu um S₁, significante sem outro significado.
Quando entrega a última prova e é recompensado com o diploma, ou com o passe, quando se trata da formação de
psicanalistas, o aluno volta a ser o sujeito barrado sob esse significante S₁ . É isso que o autoriza a ser professor.
Com a formatura, recupera-se o discurso do mestre e a história se reproduz.
Em algum lugar deve estar escondida a razão última, a essência, dessa relação. De posse
dela saberei orientar-me tanto na demonstração quanto nas aplicações.
Em
nossos termos, Ṩ diria: Esse a que me falta e que talvez o Outro tenha, é o a sustentado por um saber S₂
de posse do qual eu me produzirei como senhor S₁. É o desejo do Ṩ,
funcionando a partir da posição do Outro, que faz o discurso do objeto. Pondo-se
na posição do Outro, Ṩ examina, interrogando o objeto, posto
na posição do desejo. Aí começa sua via crucis.”
A relação afetiva
entre duas pessoas fragmentadas tentando manter a relação é a Torre de Babel
onde ambas são objeto e não sujeito da ação, aí a relação se torna promíscua. Esses
buracos resultam na desmotivação, não há ação. Ex.: Uma mulher diz que o marido
é chato. Essa leitura que faz do marido é um buraco na sua estrutura que a
impede de gostar dele. Se ela fechar essa falta irá acontecer um conjunto de novas
atitudes que resignificarão o sujeito tornando-o melhor porque ele se tornará a
expressão do desejo.
A rotina é uma
obrigação enquanto sujeito barrado até criar uma opção, no entanto, se algo
acontece de diferente causa irritação.
No imaginário não
existe sujeito consciente e ele se torna um “ser” quando fecha os buracos
instintivos significando-os. Quando uma pessoa se coloca na terceira pessoa,
ela está muito longe dela. Ela pode produzir soluções fantásticas criadas pelo
Self que engole o eu. Ex.: Pelé = Suspensão do eu. Mas com a terapia ela vai saindo do “outro” (mãe) para o “Outro” (Pai, Divino).
Os nossos companheiros são de fato
como são ou são produtos daquilo que compreendo dentro da minha cadeia de
significantes?
O que temos na
nossa frente é um Sujeito Barrado. O seu sofrimento é o buraco, o espaço vazio.
Falta uma emoção que reconhece que ele não é o sujeito. A maneira pela qual se
percebe esse buraco é dada pela projeção. Se o sujeito não ficar apavorado e
não achar o sujeito preso, não resolve fecha o buraco na psique por isso que há
um momento que a morte é uma situação de cumplicidade por ter um significado a
tal ponto que não há mais espaço para a significação.
Não existe loucura; só existe a
incapacidade para entender.
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